28 outubro 2007

Considero um valor

Considero um valor todas as formas de vida,
a neve, os morangos, as moscas.
Considero um valor o reino mineral e a república das estrelas.
Considero um valor o vinho enquanto dura a refeição,
o sorriso involuntário,
o cansaço do que não se poupou,
dois velhos que se amam.
Considero um valor o que amanhã não terá valor
e o que hoje vale pouca coisa.

Considero um valor todas as feridas.
Considero um valor economizar água,
reparar um par de sapatos,
calar-se no momento certo,
acorrer a um grito,
pedir licença antes de se sentar,
experimentar a gratidão sem se recordar por quê.

Considero um valor
saber onde se encontra o norte numa divisão da casa,
qual é o nome do vento que vai secando a lavagem.
Considero um valor a viagem do vagabundo,
a clausura de uma freira,
a paciência do condenado qualquer que seja a sua falta.
Considero um valor o uso do verbo amar
e a hipótese de existir um Criador.

Alguns destes valores, não os conheci.


Erri de Luca
Opera sull'acqua (Roma: Einaudi, 2002)

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