(...)
Manter viva a realidade das democracias é um desafio deste momento
histórico, evitando que a sua força real – força política expressiva dos
povos – seja removida face à pressão de interesses multinacionais não
universais, que as enfraquecem e transformam em sistemas uniformizadores
de poder financeiro ao serviço de impérios desconhecidos. Este é um
desafio que hoje vos coloca a história.
(...)
A Europa sempre esteve na vanguarda dum louvável empenho a favor da
ecologia. De facto, esta nossa terra tem necessidade de cuidados e
atenções contínuos e é responsabilidade de cada um preservar a criação,
dom precioso que Deus colocou nas mãos dos homens. Isto significa, por
um lado, que a natureza está à nossa disposição, podemos gozar e fazer
bom uso dela; mas, por outro, significa que não somos os seus senhores.
Guardiões, mas não senhores. Por isso, devemos amá-la e respeitá-la;
mas, «ao contrário, somos frequentemente levados pela soberba do
domínio, da posse, da manipulação, da exploração; não a “guardamos”, não
a respeitamos, não a consideramos como um dom gratuito do qual cuidar» .
Mas, respeitar o ambiente não significa apenas limitar-se a evitar
deturpá-lo, mas também utilizá-lo para o bem. Penso sobretudo no sector
agrícola, chamado a dar apoio e alimento ao homem. Não se pode tolerar
que milhões de pessoas no mundo morram de fome, enquanto toneladas de
produtos alimentares são descartadas diariamente das nossas mesas. Além
disso, respeitar a natureza lembra-nos que o próprio homem é parte
fundamental dela. Por isso, a par duma ecologia ambiental, é preciso a
ecologia humana, feita daquele respeito pela pessoa que hoje vos
pretendi recordar com as minhas palavras.
(...)
É tempo de promover as políticas de emprego, mas acima de tudo é
necessário devolver dignidade ao trabalho, garantindo também condições
adequadas para a sua realização. Isto implica, por um lado, encontrar
novas maneiras para combinar a flexibilidade do mercado com as
necessidades de estabilidade e certeza das perspectivas de emprego,
indispensáveis para o desenvolvimento humano dos trabalhadores; por
outro, significa fomentar um contexto social adequado, que não vise
explorar as pessoas, mas garantir, através do trabalho, a possibilidade
de construir uma família e educar os filhos.
De igual forma, é necessário enfrentar juntos a questão migratória.
Não se pode tolerar que o Mar Mediterrâneo se torne um grande cemitério!
Nos barcos que chegam diariamente às costas europeias, há homens e
mulheres que precisam de acolhimento e ajuda. A falta de um apoio mútuo
no seio da União Europeia arrisca-se a incentivar soluções
particularistas para o problema, que não têm em conta a dignidade humana
dos migrantes, promovendo o trabalho servil e contínuas tensões
sociais. A Europa será capaz de enfrentar as problemáticas relacionadas
com a imigração, se souber propor com clareza a sua identidade cultural e
implementar legislações adequadas capazes de tutelar os direitos dos
cidadãos europeus e, ao mesmo tempo, garantir o acolhimento dos
imigrantes; se souber adoptar políticas justas, corajosas e concretas
que ajudem os seus países de origem no desenvolvimento sociopolítico e
na superação dos conflitos internos – a principal causa deste fenómeno –
em vez das políticas interesseiras que aumentam e nutrem tais
conflitos. É necessário agir sobre as causas e não apenas sobre os
efeitos.
(...)
A vós, legisladores, compete a tarefa de preservar e fazer crescer a
identidade europeia, para que os cidadãos reencontrem confiança nas
instituições da União e no projecto de paz e amizade que é o seu
fundamento. Sabendo que, «quanto mais aumenta o poder dos homens, tanto
mais cresce a sua responsabilidade, pessoal e comunitária» , exorto-vos a
trabalhar para que a Europa redescubra a sua alma boa.
(...)
Queridos Eurodeputados, chegou a hora de construir juntos a Europa que
gira, não em torno da economia, mas da sacralidade da pessoa humana, dos
valores inalienáveis; a Europa que abraça com coragem o seu passado e
olha com confiança o seu futuro, para viver plenamente e com esperança o
seu presente. Chegou o momento de abandonar a ideia de uma Europa
temerosa e fechada sobre si mesma para suscitar e promover a Europa
protagonista, portadora de ciência, de arte, de música, de valores
humanos e também de fé. A Europa que contempla o céu e persegue ideais; a
Europa que assiste, defende e tutela o homem; a Europa que caminha na
terra segura e firme, precioso ponto de referência para toda a
humanidade!
Excertos do Discurso do Papa Francisco ao Parlamento Europeu em Estrasburgo. 25 novembro 2014
(O texto em destaque é uma escolha deste blogue)
[ TEXTO COMPLETO ]
Fonte: Rádio Vaticano
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